quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A Emboscada

O governo estava em alerta. O país atravessava uma das piores crises civis da história. E não era uma dessas crises que tinham algum objetivo, como emancipações ou reações públicas ao governo. Era uma crise insana, sem análises, sem objetivos; que começou silenciosa e da mesma forma começou a ser disseminada. Ela se baseava numa série de homicídios que pipocavam por todo canto do país, mas inicialmente estava sendo vista como acessos de ira em pontos isolados. Mesmo assim, o clima era tenso com a nova situação e a mídia cobrava uma posição da presidência. E em uma medida desesperada, o exército foi acionado.

Alguns analistas julgavam que a crise se baseava numa reação à opressão secular imposta à sociedade “comum” do país. Eles se baseavam nessa explicação porque os principais alvos eram políticos, policiais e bandidos (principalmente traficantes). Além deles, ainda havia outros alvos potenciais, como advogados, lojistas e agiotas (principalmente banqueiros). Treze unidades de vinte homens fariam a primeira cobertura intermunicipal do exército para um posterior assentamento na cidade de destino. Faríamos a proteção de uma comitiva de deputados que viajaria um percurso de doze quilômetros, numa pequena estrada de uma cidade a outra.

Além da escolta, ainda havia a proteção da região por onde essa comitiva iria passar. Por isso a operação seria dividida em duas etapas. A primeira seria a preparação da estrada, que seria vasculhada anteriormente por sete destas unidades do exército. A segunda etapa seria a escolta propriamente dita, que seria realizada pela outras seis. Que burrice! Assim como as outras partes envolvidas na missão, caso dos policiais e políticos, soldados também são alvos em potencial! O governo estava colocando mais gente em risco em vez de em segurança.

Logo que amanheceu saímos nos caminhões do exército em direção a estrada para a primeira etapa. Um colega ao lado comentava que estava com medo de dormir em casa, porque sua esposa estava muito estranha nos últimos dias. Tinha receio de dividir a cama com a sua mulher. Que tipo de loucura era essa? Por que sobrevivemos ao campo de batalha se temos homens que temem retornar para casa? Imagine se tivermos que começar a temer nossos próprios pais, desde que sejam de origem humilde! Porque é isso que os analistas também dizem: trata-se de uma revolta popular, surgida de classes mais humildes e oprimidas, pronta pra dizimar toda e qualquer origem de repressão. Mesmo que essa origem seja simbolizada pelo seu próprio filho, ou marido.

Desci acompanhado de mais um companeiro em direção a um bairro na beira da estrada. Outros dois soldados saltariam mais à frente, para cobrir uma outra área. Era aquele tipo de habitação de baixa renda, com casas pequenas e pobres. Como esperavam que dois soldados fossem dar conta de inspecionar toda uma região hostil como aquela? Lá residiam muitas donas de casa, pedreiros, mecânicos... Enfim, exatamente o tipo de perfil considerado “perigoso”. Com armas em punho, corremos em direção a um corredor e cobrimos uma parede cada. A qualquer momento podíamos ser abordados. Seguimos em frente e nos dividimos.

Mais alguns passos no bom silêncio do início da manhã. A vida voltava ao normal, pelo menos o que deveria ser chamado de normal. Como não estávamos no centro da cidade, ainda conseguia ouvir o som de alguns pássaros que davam boas-vindas a mais um dia. Não demorou muito para que essa orquestra (mesmo bem deficitária, até porque ainda estávamos no perímetro urbano) fosse interrompida por um estouro a pouco mais de cem metros dali. Com o som do disparo, os raros pássaros que cantarolavam se assustaram e um silêncio mórbido tomou conta do local novamente. Assim como quando havíamos chegado.

O combinado antes de sairmos do caminhão era que em vinte e cinco minutos todos iriam se encontrar no mesmo ponto em que saltamos. Temi que um de meus companheiros não pudesse cumprir o combinado. Segui por mais uma ruela, que desembocava em uma rua um pouco maior, paralela à estrada. Ao entrar na primeira direita, deparei-me com um homem moreno, que não devia ter mais de um metro e setenta, com um pedaço de pau na mão e um prego enferrujado na ponta. Ao lado dele apareceu uma mulher, bem mais baixa, empunhando uma faca de cozinha.

Dei meia volta. Aqueles dois não poderiam me alcançar e eu não precisaria matá-los. Poderia correr. Porém, ao olhar pra trás percebi que haviam chegado mais duas pessoas. Eram dois rapazes, um devia ter quinze anos e outro vinte, ambos segurando pedras. Era uma emboscada. Apontei o rifle para o homem, mas nenhum deles recuou. Ameacei atirar, mas continuaram me ignorando. Senti um aperto no peito. E muito medo. Dependia apenas de mim disparar em todos eles. Era só apontar, apertar o gatilho e fazer todos aqueles malditos caírem.

Malditos? O que eles tinham feito pra mim? Na verdade, isso não importava muito. O que importava era o que eles iriam fazer comigo. Era guerra! Mesmo que fosse civil, mesmo que não fosse justa, era guerra! Uma batida forte nas costas. Uma pedra havia sido arremessada no meu ombro direito e notei que os rapazes corriam na minha direção. Corriam na minha direção atirando pedras. Logo que me virei disparei contra o mais velho, que tombou inerte no chão. Só foi preciso uma bala, certeira, acima da sobrancelha direita para fazer da cabeça dele milho de pipoca no microondas. Mas, para minha surpresa, o mais novo não hesitou em continuar correndo. E nem sequer olhou pra trás. Era um garoto, eu não podia atirar nele. Para evitar outro disparo, desviei de uma pedra arremessada por ele e o acertei com um soco na barriga, fazendo o perder o ar e tombar no meu braço.

Quando me lembrei dos outros dois, senti uma lâmina atravessar o meu fêmur. A mulher havia perfurado a minha coxa com a faca enquanto eu ainda segurava o corpo do garoto, que ainda não conseguia respirar direito. Será que eu estava sendo atacado por uma família? Será que eu tinha acabado de matar o irmão desse menino? Ou o filho desse casal? Nenhum deles falava nada. Eles só rosnavam e gritavam. O garoto continuava tentando re-estabilizar sua respiração, a mulher havia acabado de tirar a faca da minha perna e provavelmente preparava-se para outro golpe. E o homem? Onde estava ele?

Antes que a mulher pudesse me cravar novamente a lâmina, acertei-a com a coronha do rifle, fazendo-a cair pro lado. Por um momento comecei a planejar minha próxima ação, mas fui surpreendido por uma forte pancada no rosto. Com certeza era o homem, que eu havia perdido de vista. Estava me acertando com aquele pedaço de pau. Tive certeza de agora ter um buraco na bochecha e dois dentes a menos na boca. E tétano também, provavelmente.

Senti meu corpo perder a força de reação e cair pro lado. Ao abrir os olhos, vi meus dois dentes bem próximos. Ainda atordoado, percebi também que já não tinha o rifle comigo. Outra pancada violenta na altura da costela, mais uma vez acompanhada de uma perfuração. Muita dor! Um gosto forte de sangue tomou conta da boca, que ao se misturar com a saliva ganhou volume para saltar os lábios. Chutes sucediam as pancadas com o pedaço de pau. Havia mais gente ali. Fechei os olhos e passei a língua onde havia um dente. Mais gosto de sangue e a sensação de lamber sabugo de milho. As luzes apagaram e vi alguns de meus companheiros sorrindo. E eu também podia sorrir com eles, porque ainda tinha meus dentes.

Rambo

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Gente Boa

Há alguns anos conheci um cara que eu chamaria pelo termo “gente boa”. Isso já faz aproximadamente uns sete anos. Quando o conheci, obviamente, era mais tímido e não demonstrava confiança alguma em mim. Não se aproximava muito, normalmente não demonstrava emoções; só se manifestava para pedir alguma coisa. De fato, como esperar que alguém que acaba de chegar ao seu cotidiano já confie inteiramente em você?

Com o tempo se revelou um grande parceiro. Mesmo em tempos difíceis, daqueles que desanimam qualquer um, ele não saía do lado. Fosse chuva, ventania, sol forte, ele não arredava o pé de seu posto! Seu único ponto fraco eram os raios e trovões, o que nunca teve vergonha de admitir. Mas, independente do medo, estava ao meu lado. Quando eu caía por alguma mazela selvagem, era certo que até na enfermaria ele faria questão de estar.

E companheiro de guerra que se preze sempre tem história pra contar né? Lembro-me quando ele foi atropelado e tive de carregá-lo no lombo selva adentro até chegarmos ao acampamento. Houve outra vez em que o fizeram de refém e, para salva-lo, tivemos de traçar um plano de resgate audacioso para encontra-lo na selva depois de sua fuga; quando foi alvejado nas costas e tivemos de operá-lo em campo de luta para retirar a bala; ou quando percorremos e mapeamos toda zona de batalha próxima ao nosso acampamento - trabalho que durou quase uma semana camuflados no mato.

O engraçado é que com o tempo fica muito fácil saber das reações de alguém tão presente assim. E confesso que não levei muito tempo para começar a reconhecer suas atitudes. Sempre de poucas palavras, quando abaixa uma sobrancelha e move uma orelha, é dúvida. Estranhamento e curiosidade significam apenas uma franzida na testa, aí é uma questão de interpretação. Normalmente a curiosidade é seguida de uma mexida nas orelhas, mas não é sempre. Felicidade significa olhos esbugalhados e uma leve “sorrisada”, porque eu não consideraria aquilo um sorriso de tão disfarçado nas bochechas. Quando a empolgação é forte quase que sai do lugar de tanto que treme e chacoalha. E as suas bochechas grandes ainda fazem estas expressões ficarem muito mais engraçadas quando as identifico.

Não há exatamente como definir o que esse cara significa pra mim. Não só um amigo, um parceiro, mas também um irmão, um filho. Como já disse, ele é de poucas palavras, e admito que a maior parte de nossas conversas são telepáticas. Mas fazer o que? Quando sento e acendo um cigarro para pensar, ele senta ao meu lado e não diz nada. Não precisa dizer. E olha que dizem por aí: gente boa, gente boa... gente, mesmo, não é boa nada. Bom mesmo é meu fiel escudeiro Sargento.

Rambo

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Saudades de Casa

Existem horas que nós percebemos a quão nossa vida está perdendo o sentido. Alguns dias sentado numa trincheira (ou atrás de qualquer coisa que bloqueie uma bala), ouvindo tiros para todos os lados, olhando para a cara cansada dos mesmos companheiros que não têm mais o que falar. Nós simplesmente trocamos olhares e sabemos o que o outro está sentindo. O olhar desolado e um demorado suspiro transmitem perfeitamente a sensação de exaustão. E o pior é que a cada dia que passa acordamos com o temor de perder mais um irmão em outro dia como aquele. Mas, mesmo com esse medo diário, hoje tínhamos a expectativa de alcançar um hotel, próximo ao cemitério de Porto Príncipe.

Foi-nos informado que lá teríamos proteção e suprimentos, pelo menos pelos próximos três dias. O primeiro passo era atravessar o cemitério e entrar na Rua Alerte. O problema é que como é uma rua comprida, talvez nosso grupo tenha que se separar ou fazer desvio de rota. Assim, entraríamos na Titus e depois na Cadet Jeremie, a rua do Hotel Oloffsson. Depois de passarmos pela Chreron e alcançarmos a Dr. Dehoux, avistamos os muros do cemitério. Contornarmos o jardim dos mortos para então chegar a Alerte, que liga a Boulevard Henry Turman até uma paralela a Titus, nas proximidades da Rua Cadet Jeremie.

O dia amanhecia quando iniciamos a operação, trocando de posições pelas calçadas da rua e passando por lugares cobertos, tentando evitar que fôssemos vistos. Nos dividimos em três de cada lado da rua. Era um pouco arriscado, mas poderíamos pegar a segunda curva a direita para entrarmos na Rua Titus, menor e aparentemente mais segura que a atual. Assim que terminamos de percorrer a extensão do cemitério e passamos pela primeira direita, ouvimos o barulho de um disparo. Ao olhar pro lado, percebi que o Gavião (o potiguar gente boa) havia sido alvejado. Estava caído próximo à rua, com sua cabeça envolta em uma poça de sangue. Temendo outros disparos, nossos companheiros se esconderam imediatamente.

Senti o peito doendo um pouco. Não só Gavião havia acabado de morrer, como também Luiz César Gomes, o homem que estava por baixo daquela farda, com mulher e filha. Resolvemos esperar alguns instantes, tentando fazer com o que o inimigo acreditasse que nosso companheiro estava sozinho. Sentamos um pouco e começamos uma oração baixa pela alma de nosso amigo. Chorei um pouco. Ainda havia mais um trecho de pelo menos cento e cinqüenta metros da Rua Alerte até podermos virar a direita e chegar ao nosso destino parcial.

Precisávamos de pelo menos uns dez minutos, para cansar o atirador. Lembrei-me de quando mais novo ia pra fazenda do meu pai, no interior do Rio de Janeiro. Era tão fácil ser feliz com coisas tão simples, como andar a cavalo, tomar leite direto da vaca ou brincar de guerra de mamonas. Comer um pão quente com bastante queijo, presunto e manteiga, ainda acompanhado de um pote de doce de leite de sobremesa. Nada como a simplicidade mineira disfarçada no estado do Rio de Janeiro. Talvez lembrando também da infância, estavam ao meu lado o Calango (um baiano nervoso) e o Esquilo (um gaúcho bem calmo). Nos mantínhamos em silêncio, pensativos. Ou sobre nossos destinos ou sobre nosso passado.

Partimos em direção ao que acreditávamos ser a parte mais perigosa do trajeto. Decidimos correr por lugares cobertos para evitar outro tiro, enquanto o Águia (um goiano implicante) mantinha a retaguarda com seu rifle. A Alerte carregava um clima hostil e pesado depois da morte de Gavião. Ao passarmos pelo primeiro trecho, conseguimos nos esconder para dar suporte ao companheiro que havia ficado pra trás. Mas, assim que paramos, percebemos que Águia havia disparado duas vezes na direção de Calango, que havia ficado assustado olhando pra trás. Assim que o baiano se abaixou pronto para xingar o goiano, o corpo de um rebelde tombou por cima do caixote de madeira que Calango usava como escudo. Respiramos fundo.

Atravessamos a Alerte e chegamos na altura da Titus, onde o clima parecia mais tranqüilo para chegarmos ao hotel. Seguimos os cinco caminhando quando fomos abordados novamente, desta vez por um grupo de quatro rebeldes armados. A troca de tiros foi intensa até que os quatro nativos já estavam mortos e duas balas alojadas na minha coxa, além de um ferimento superficial no ombro do Águia. Uma dor alucinante tomou conta de toda minha perna, obrigando Calango e Coelho (um carioca quieto) a me carregarem até a Cadet Jeremie. Enquanto eu gritava de dor, Esquilo injetou uma agulha próximo ao ferimento. Não estávamos nem a trezentos metros do destino e da segurança. O céu estava cinzento naquela manhã.

Vi meu pai. Minha mãe. A fazenda. O pão. Os cachorros. Os cavalos. A cachoeira. As garotas. O futebol. A cidade grande. O mar. O quartel. A primeira farda. A primeira arma. O primeiro tiro. O primeiro alvo. O primeira guerra. As nuvens no céu se torciam em desenhos psicodélicos naquele firmamento caribenho sem graça. O cinza havia dado lugar a cores vivas como azul, verde, amarelo e rosa. Desenhos coloridos dançavam na minha frente e davam uma estúpida vontade de sorrir para o nada. Não sentia mais dor. Mesmo transformando minha mente em uma tempestade de pensamentos, não conseguia chegar a nenhuma conclusão sobre absolutamente nada. Pisquei os olhos.

A primeira coisa que vi foi o rosto do Esquilo. Não estávamos mais a céu aberto. As cores tinham sumido. Parecia que havíamos chegado ao hotel, finalmente. Olhei para os lados e lá estavam Calango e Coelho, devorando um prato de comida. Certamente estávamos no hotel. Antes que eu pudesse associar tudo o que havia acontecido, ouvi Esquilo dizer: “Guri, tua perna tá muito mal. Tu vai voltar pra casa”.

Rambo

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Rambo: A Missão Final

Seria muito fácil terminar aquele dia sem receber uma ordem direta do Conselho. Diria Conselho pra não dizer Estado, pra não dizer as mais altas patentes militares. Quando esse tipo de coisa acontece, sabemos que o partido rival deu algum furo e chamou atenção demais com suas ações. Em períodos como este, é importante ser discreto.

Estas missões nunca eram complicadas de se realizar. É incrível como quando nos encarregam de algo desse valor eles já têm tudo pronto. Logo ao entardecer daquele dia, o carro que seria utilizado estaria estacionado próximo a um restaurante, nas proximidades do batalhão vizinho. Lá já estariam dois agentes que me dariam cobertura. Logo que o alvo saísse de sua casa de carro, o iremos abordar com permissão de abrir fogo.

Não havia passado das cinco da tarde. Era o tempo para eu me preparar psicologicamente para a missão. A cada dia que passa este tipo de ordem era dada para militares de patente semelhante a minha e já começava a virar rotina. Somos cargos de confiança. Confiança essa que retribuímos com serviços à nossa bandeira. Que retribuímos com nosso silêncio.

Mas por que temos que lutar e matar pessoas que lutam pela mesma bandeira que nós? Algo que me inquieta sempre é o fato de que, se lutamos por um bem maior, se lutamos pelo nosso país, por que fazemos tudo às escondidas? Existem momentos em que parece que a população vive num grau de alienação e aceitação tal que, independente das atitudes do Conselho, não faz a menor diferença. Por mais que as pessoas tenham consciência de algumas coisas, o medo faz com que hesitem em lutar.

Estava vestido com o colete, armas no coldre, roupas comuns, um comum frio na barriga e faltava apenas quarenta minutos para a missão se iniciar. Já era hora de tomar postos e esperar o momento. A rua nunca era muito barulhenta e nesse dia apresentava uma quietude ainda mais sobrenatural. A missão estava algum tempo adiantada e os dois agentes já me esperavam num carro conversível preto de emplacamento civil, como sempre.

Só não posso dizer que aqueles foram os piores minutos da minha vida porque já tinha passado por aquela situação outras vezes e sentia a mesma coisa. Mas algo me dizia que daquela vez não era só isso. Mas o mais importante era manter a calma, respirar fundo, empunhar o rifle e atirar. Atirar em um compatriota. Era uma questão de poucos segundos e terminava o serviço. Mas mesmo assim, a cada dia que passava recebíamos uma nova ordem para executar alguém da oposição e a cada dia ressurge a esperança de que esta será a última vez.

A porta da garagem foi aberta lentamente enquanto um carro vermelho se preparava para sair. Era chegada a hora. O nosso carro estava posicionado próximo à porta da garagem e o cano do rifle já estava preparado e carregado. Era só esperar o carro terminar de sair da garagem e disparar na lataria do alvo mesmo, já que a bala do rifle seria capaz de perfurar o metal. Tínhamos uma boa distância, e com o silenciador, não iríamos levantar suspeitas. Apenas mais um segundo e...

Por um momento acreditei que tudo tinha dado certo, a missão havia terminado e eu só precisava contar com o pé no acelerador do meu comparsa. O vidro ao lado da cabeça do alvo estava banhado de sangue, que deveria ter jorrado de seu pescoço ao ser atingido. O buraco aberto no outro carro estava estrategicamente posicionado onde a bala deveria ter se alojado no alvo, logo acima da clavícula. Assim que nosso veículo arrancou, percebi que o motorista do defunto olhava horrorizado pra trás, quando levantou um pequeno braço pelas mãos. Lá estava um menino, uma criança, que mal deveria ter seus cinco anos, inerte. Enquanto o motorista gritava e saía do carro com o garoto no colo e curiosos se aproximavam, conseguimos fugir. Olhei para o rifle em minha mão. Girei-o segurando pelo cano e aproximei o indicador da outra mão ao gatilho. O metal não estava muito frio. Senti gosto de ferro. Teria sido muito fácil terminar aquele dia sem receber aquela ordem direta do Conselho.

Rambo